“Uma cineasta vai para Hollywood no começo dos anos 1990 para fazer seu filme, mas se depara com um mundo alucinante de sexo, magia, vingança…e gatinhos.” Essa é a pacata e um tanto infantilizada sinopse dada pela Netflix à sua nova minissérie Vingança Sabor Cereja, estreada na sexta-feira, 13 de agosto. Ao contrário do que o resumo propõe, a obra é um encontro visceral entre o terror gore e o thriller psicológico, conduzida pela brilhante dupla de Nick Antosca e Lenore Zion, e baseada no livro de Todd Grismson.

Vingança Sabor Cereja conta a história de Lisa Nova, que ganha vida através da atriz Rosa Salazar, cujo o objetivo é lançar seu filme “O olho de Lucy” no cenário de uma Hollywood sombria dos anos 1990. Ela chega a Los Angeles sem dinheiro e morando no próprio carro, mas com uma promessa de entrevista promissora com um dos figurões que dominavam a indústria cinematográfica da época: Lou Burke, interpretado pelo ator Eric Lange.

A obra é precisa em descrever os submundos exploracionistas hollywoodianos, especialmente para uma mulher latina na década de 90. Como já era de se esperar, o acordo fechado por Lisa e Burke vai por água a baixo em poucos minutos de tela ao que o produtor a assedia e a trai quando rejeitado. Esse é o estopim para que Lisa vá até Boro, uma bruxa interpretada por Catherine Keener, que a convence a fechar um acordo para conseguir sua vingança.

A partir daí, a trama ganha vida e se desenvolve orgânica e violentamente ao longo de 8 episódios. Rosa Salazar entrega uma protagonista sublime, e sua atuação não deixa a desejar mesmo nos momentos mais críticos, em que sua expressividade no olhar se firma como um dos grandes méritos da série. A nacionalidade brasileira da personagem traz também ao espectador local algumas surpresas agradáveis como diálogos em português e até a aparição saudosista de um refrigerante de guaraná.

Ademais, Vingança Sabor Cereja navega entre o gore horrorístico, com as aparições escatológicas de gatos e cenas de sexo inusitadas, e um suspense surrealista que beira a inspirações lynchianas. Tudo na série flerta com o onírico, desde a ambientação de uma Los Angeles febril em tons neons desorientadores, até a câmera inquieta que leva o espectador à sua própria jornada de terror e confusão. De fato, a obra entrega takes tão bonitos e delirantes, que em vários momentos deixa o desejo de que a câmera se prolongasse mais nos detalhes, ao invés de ceder a uma pressa já conhecida em outros trabalhos da plataforma.

Logo, mesmo que a obra não corresponda às expectativas no que diz respeito a efeitos especiais e ofereça ao público um final tão repentino, é fato que a mesma merece maior destaque e reconhecimento. Vingança Sabor Cereja é inusitado de um jeito espirituoso, e foge dos padrões estabelecidos pela Netflix em grande parte de suas produções. Para os fãs de terror que não encontraram a obscuridade que procuravam em filmes como Rua do Medo, essa é uma ótima oportunidade para se surpreender.

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