Uma das minhas motivações para querer assistir “Tudo o Que Você Podia Ser” foi essencialmente o título, que é uma das minhas músicas favoritas do disco “Clube da Esquina”.

Acredito que a canção, interpretada maravilhosamente por Milton Nascimento, e escrita por Lô Borges, traz a temática da potência – aquilo que podemos vir a ser – e é tudo o que esse filme representa. A música fala sobre um tempo em que se sonha com um futuro melhor, quando nos tornamos o grande protagonista dessa longa estrada que chamamos de vida. O filme retrata justamente essa passagem, o momento em que as aspirações juvenis florescem e a esperança de que as coisas podem melhorar surge.

Na obra, acompanhamos as interações diárias e dos momentos compartilhados entre os personagens das quatro amigas de Belo Horizonte: Aisha, Bramma, Igui e Will. Cada uma delas apresenta estar em um ponto de guinada em sua vida, seja mudar de emprego,  ou ingressar em uma universidade, ou sair da casa dos pais ou até mesmo sair do país para uma integrar uma pesquisa de pós-graduação.

A despedida de Aisha é o pontapé, e ao decorrer assistimos a apresentação de personagens que a fazem companhia. Conseguimos identificar os sentimentos e as sensações de cada pessoas trans que dividem afeto e gestos generosos entre si, ou seja, são pessoas que decidiram ficar juntas para superar as muralhas que a sociedade construiu. O medo é presente no tempo, mas o que cultiva os atos de bravura e rebeldia é o fato de que podem contar uma com as outras em frente a qualquer adversidade.

São exatamente essas muralhas que impedem pessoas trans e negras de voarem,  que são seres com potência que,  para trilharem seus caminhos, infelizmente passam por percalços. Inclusive isso é um ponto para o filme quando se trata de representação, pois esses momentos de transição em suas vidas são retratados de modos diferentes devido aos demarcadores raciais.

Mesmo com todas as dificuldades, seja no sol e na chuva, ainda é preciso sonhar e também ter a ideia de que mesmo que não tenhamos  alcançado tudo o que queríamos, ainda é alguma coisa, pois estamos vivos. Assim é a nossa jornada no mundo e isso é ter prosperidade.

Ricardo Alves Jr. (“Russa”, 2018) é quem assume a direção do filme com o roteiro de Germano Melo (”Elon Não Acredita na Morte”,2016), os quais demonstram saber retratar o cotidiano de pessoas trans. Aisha Brunno, Bremmer Bramma, Igui Leal, Will Soares fazem sua estreia na atuação neste longa metragem e conseguem extrair o máximo de suas performances.

Entre os diálogos, que mais se parecem que já se conhecem há anos, conseguimos entrar para dentro das rodas de conversas. A escolha estética da produção de gerar um contraponto entre os movimentos de câmera e focar em uma câmera estática para exalar uma calmaria e suavidade visual com o ritmo frenético do centro da cidade combina muito bem com a narrativa em questão.

É sempre bom lembrar aos nossos o seu verdadeiro potencial e evitar remoer o que poderíamos ter sido. Aqueles que estão em uma situação de vulnerabilidade precisam lutar constantemente por seus direitos negados pela estrutura social. Nesses momentos, o acolhimento é sempre bem-vindo. Assim, quando olhamos para o passado ou presente e refletimos sobre o que passamos ou o que estamos passando, podemos perceber que isso nos torna mais resistentes. Então dessa forma seríamos capazes de responder a pergunta:

Qual é a sua lembrança mais forte?

Revisado e editado por Anna Beatriz Rodrigues

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