Por Ana Carolina Ferraz
O clube das Mulheres de Negócios de Ana Muylaerte se propõe a apresentar uma comédia onde os estereótipos de gênero se invertem, para que o público se choque com certos absurdos tão normalizados dentro de uma sociedade machista. Nesta ficção, são as mulheres a ocupar os cargos de poder, a deter o dinheiro e a força física, enquanto os homens são hiperssexualizados, silenciados e menosprezados.
A sátira e o humor escrachado, são uma ferramenta eficaz que a arte possui para causar incomodo ao público sobre assuntos que requerem um toque de absurdo, por serem, em seu cerne, nada mais que isso: absurdos. Entretanto, a proposta de Muylaerte, apesar de (infelizmente) parecer cada vez necessária em um cenário político dentro de uma sociedade que se torna cada vez mais conservadora, se perde em suas próprias críticas não aprofundadas ou até mesmo apagadas por um humor que extrapola o clichê e a obviedade do espectador.
Em 2018, a Netflix lançava a comédia francesa “Eu não sou um homem fácil” (Je ne suis pas um homme facile) com o mesmo intuito de causar a empatia pela luta feminina demonstrando, através da inversão dos papeis de gênero, o machismo do cotidiano. O filme francês de Eléonore Pourriat gerou inúmeros debates nas redes sociais e algumas críticas de setores femininas sobre a manutenção de clichês e banalização de temáticas sensíveis. Fatos que mais podem atrapalhar o debate que o filme se proporciona a fazer do que, de fato, suscitam uma reflexão crítica. Ana Muylaerte repete estes mesmos erros em seu novo longa, de maneira ainda mais exagerada.
Em primeiro lugar, é necessário pontuar que a ideia de ambos os filmes, tanto o francês quanto brasileiro, pecam em trazer uma profundidade para crítica que se propõe a fazer. Não há uma reflexão sobre o porquê destas posições de poder serem ocupadas por determinados sexos, ou possibilitando a reflexão sobre a construção de nossa própria
sociedade. No caso do filme brasileiro, com mais intensidade, os personagens masculinos não são explorados como poderiam ser. Não há profundidade para o público poder se empatizar com o sofrimento pelo qual o personagem passa. Em determinado momento do filme, uma cena de explicito abuso sexual é retratada de forma caricaturada, e logo em seguida, sufoca o público com mais uma piada torpe e sem contexto.
As personagens de Katiuscia Canoro é uma armamentista extremista, Irene Ravache oprime seu marido mantendo abertamente um circulo de amante, Grace Gianoukas é conhecida por assediar sexualmente homens mais jovens, entre outros estereótipos simplistas do masculino. Portanto, não há um sentimento de conexão com o “sexo frágil” que é oprimido. Existe, no máximo a criação de uma raiva coletiva pelas personagens femininas que retratam e representam todos os piores estereótipos de masculinidade tóxica, violenta e nociva que podem existir.
Ana Muylaete, ainda conclui seu filme sem um desfecho satisfatório. A redenção final não vem por meio de uma revolta coletiva dos oprimidos, de uma virada de sensibilização dos opressores, nem mesmo oferece ao público alguma movimentação esperançosa de mudanças. O momento de catarse do filme vem das onças criadas em cativeiro por uma das personagens principais.
Talvez em uma tentativa de questionar a impossibilidade do homem em dominar a natureza, o filme se conclui sem uma resolução dos próprios problemas propostos, além de incluir algumas cenas de massacre que tentam chocar o público pelo senso de absurdo, mas que perdem completamente o impacto, uma vez que todos os movimentos finais se tornam óbvios e clichês.
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