“Eu acho que ele é um gangster clássico.” Assim, narra o trailer da minissérie fracionada em quatro episódios com cerca de 50 minutos cada. Esta síntese da personalidade de João vai sendo lapidada ao longo da narrativa, pois ninguém é uma só coisa.

A Netflix vem investindo em minisséries documentais relacionadas à escândalos midiáticos. Dois desses exemplos que me remeteram diretamente à João de Deus: Cura e Crime são: Wild Wild Country que conta a história do líder religioso Osho e Elize Matsunaga: Era uma vez um crime (acesse aqui a crítica) que relata o assassinato do empresário Marcos do Grupo Yoki.

Seguindo essa linha, o formato do seriado é bem padronizado na linguagem fílmica. Entrevistas e imagens de arquivo sobressaem ao que vemos na tela, lembrando uma matéria jornalística investigativa. Porém, não seria uma obra cinematográfica sem os toques da direção de Maurício Dias e Tatiana Villela.

A direção personifica alguns elementos da sede religiosa, transformando o espaço em cúmplice dos milagres e crimes cometidos. Pode-se destacar o triângulo desgastado e marcado na parede, bem como a sala de “atendimentos” de João. Esta sala praticamente ganha vida na narrativa, mostrando-se como a detentora de todos os segredos e abusos.

Outro aspecto singular da série é a predominância do discurso das mulheres. Muitas das envolvidas no caso foram entrevistadas e intituladas como sobreviventes no texto abaixo dos nomes. É através do discurso delas que a personalidade degradante do líder religioso ganha forma e faz com que o espectador passe a enxergar nas imagens de arquivo, um semblante diferente em João, antes tido como santo. 

Porém, não foi através apenas das sobreviventes que a narrativa desconstrói a imagem do médium. Aliados da sede da ordem religiosa e da pequena cidade de Abadiânia também ganham voz e relatam as suas vivências. Questões sobre os lucros e acordos com o comércio desvendam o lado empresarial da casa religiosa comandada por João.

O efeito do seriado é uma crítica à estrutura cúmplice e silenciadora dos crimes para que a fábrica lucrativa dos milagres perpetua-se. Mas o número de vítimas foi tão grotesco, que mesmo tendo a grande maioria da cidade disposta a fechar os olhos, o caso ganhou investigação e notoriedade na imprensa. Tendo como mensagem que ninguém pode se apropriar de corpos alheios de forma não consensual independente da motivação ou poder pessoal.

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