Alerta: Este texto pode conter spoilers sobre a trama.

Assim como acontece com Nova York em diversos filmes de Woody Allen, a cidade portuguesa de Sintra atua como personagem em Frankie – recente produção dirigida pelo americano Ira Sachs. A trama estrelada por Isabelle Hupert se passa ao longo de um dia da vida da consagrada atriz Frankie (Hupert), que após descobrir o agravamento de seu câncer, reúne família e amigos próximos em uma viagem.

Inicialmente, o espectador fica em uma posição voyeurística, acompanhando situações ordinárias do cotidiano de uma viagem em família. Mas, aos poucos, os conflitos e personalidades das personagens vão transparecendo nas cenas. A trama se desenvolve ao longo das ruas de Sintra, e assim como a cidade, ela ganha diferentes contornos e direções.

Frankie é uma mulher independente, vaidosa, acostumada a estar no controle, e a ser o centro de sua dinâmica familiar. Tentando lidar com a frustração diante da inevitabilidade da morte, ela decide organizar a vida dos que ficam e os acontecimentos após seu falecimento. Mas as intervenções são feitas da maneira que ela julga adequada e não necessariamente da melhor forma para os envolvidos.

Este conflito de intenções é perceptível no arco de Paul, filho de Frankie interpretado por Jérémie Renier. Frankie não concorda com as decisões que direcionaram a vida do filho e ao tentar ajudá-lo à sua maneira, acaba evidenciando sua decepção, antes velada. Magoado, Paul não só rejeita as intenções da mãe como revive situações que o machucaram ao longo da complexa relação existente entre eles. E o que poderia ser a última oportunidade para ambos resolverem suas questões, acaba se tornando mais uma mágoa.

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Através dos conflitos vividos pelas personagens secundárias da trama é que conhecemos o passado de Frankie. Os paralelos traçados pelo roteiro foram inteligentes e abordam bem o movimento cíclico daquela família. Para citar algumas destas dualidades: a neta adolescente de Frankie passa por sua primeira experiência amorosa e contesta as atitudes de sua mãe da mesma forma feita por Paul no passado; e Sylvia, enteada da personagem principal, buscando o divórcio por acreditar merecer “algo mais”, assim como a Frankie em seu primeiro casamento.

Mesmo com o desejo em conduzir seu “entorno”, Frankie irá compreender que como sua doença, o futuro é algo incontrolável. A personificação deste aprendizado está presente na personagem de Marisa Tomei, Ilene. Convidada para a viagem inicialmente para ser “apresentada” ao filho de Frankie, sem saber das intenções da amiga, Ilene chega à Sintra acompanhada de seu então namorado.

Posteriormente Ilene fica solteira, mas o vínculo que claramente acontece (para a audiência e também para Frankie em uma excelente cena), é entre ela e Jimmy, atual companheiro da personagem principal da trama. E ali naquele momento Frankie entende que a vida seguirá seu curso, com ou sem sua intervenção.

A produção possui uma direção delicada, com um já esperado excelente desempenho de Isabelle Hupert. Há sensibilidade, muitas camadas e nenhum melodrama na maneira como a vida e morte de Frankie são abordadas e isto é algo que pode não agradar, ou não alcançar a todos. Despretensioso, é um filme cuja força se pauta nas interpretações e na bela fotografia, mas nem por isso deixa de ser uma interessante catarse emocional a ser vista.

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Qual a semelhança entre CORINGA, CHAPLIN E SCORSESE?

 

 

 

Amanda Luvizotto é arquiteta, crítica de cinema formada pela Academia Internacional de Cinema do Rio de Janeiro. Integrante do grupo Mulheres no Terror, estuda sobre o papel da mulher no cinema e tem na leitura um de seus grandes prazeres. Estudante de cinema e eterna fã e defensora de Xavier Dolan.