Demais Pra Mim, filme italiano que estreou na plataforma Netflix no último dia 18, chama atenção por conter elementos lúdicos, sempre associados a um exagero formal. Trata-se do longa de estreia da diretora Alice Filippi, que opta por selecionar uma equipe de produção majoritariamente composta por mulheres, algumas também estreantes.

Aqui, temos a história de Marta (Ludovica Francesconi), jovem adulta órfã que mora com dois amigos e é portadora de uma condição rara, a fibrose cística. Dessa forma, a história gira em torno do impasse provocado por essa condição: a insatisfação amorosa. O que faz do filme se locomover nas dinâmicas entre Marta e um par amoroso desejado por ela, deixando apenas arbitrário e artificial na trama, os amigos que convivem com ela.

Já de início, a diretora apresenta a história partindo desse princípio lúdico, é a nós mostrado um evento do passado e, então, voltamos ao presente, vemos aqueles personagens do passado já adultos e eles nos são apresentados um a um, a partir de um voice-over de Marta vemos os personagens enquanto crianças e então sabemos uma característica excêntrica sua, característica essa que será mantida na vida adulta.

Existe, nesse início, uma clara inspiração no cinema de Wes Anderson e especialmente em Os Excêntricos Tenenbaums (2001), Filippi inicia sua obra da mesma forma que Wes Anderson, mas com um claro diferencial, enquanto o diretor utiliza-se dessa montagem de início para denotar a imaturidade de seus personagens enquanto adultos, Filippi faz justamente ao contrário, uma vez que seus personagens estão inseridos ainda em uma transição para a vida adulta, em uma espécie de coming of age, não há uma ironia nessa imaturidade fazendo o filme soar, assim, imaturo.

Voltando então para a apresentação dos personagens, temos que a doença de Marta surge pela primeira vez para o espectador, sua aparente falta de tempo faz com que a personagem siga em uma busca por algo maior e diferente, saindo do clichê como a própria diz. Marta então encontra um interesse amoroso, Arturo (Giuseppe Maggio), um rapaz rico, de boa família e popular, e resolve segui-lo. O que normalmente se caracterizaria como uma obsessão voyeurista é tomada aqui como um jogo, é esse caráter lúdico inerente aos personagens em pleno amadurecimento que irá acompanhar todas as relações e especialmente essa que acaba de se formar, Marta e Arturo.

Esse ponto de aventura começa muito bem à medida que reflete a personalidade da protagonista e a diferencia em relação à seu interesse amoroso, que é dotado de uma sobriedade maior. No entanto, assim que o relacionamento se desenvolve, o lúdico deixa de ser o elemento principal em todas as relações. Se a diretora se encontra justamente nesse exagero recreativo, o mesmo não pode ser dito sobre sua construção dramática, sendo justamente tais momentos que tentam acrescentar complexidade, mas ficam ali, deslocados.

Nesse sentido, vê-se também que a própria doença da protagonista, que também surge com o pretexto de acrescentar complexidade à trama, soa também artificial. Digo, haveria meios para inserir certa complexidade mesmo em uma trama mais simplista.


Sendo assim, o filme acaba retirando o drama necessário para que a narrativa se desenvolva, o exagero cênico não é suficiente para demonstrar um real peso para os acontecimentos, soando apenas como um aspecto plástico, sem refletir em outros elementos estéticos.

A decupagem, por exemplo, se torna operante não acompanhando o exagero da imagem. É essa, portanto, a principal escolha que causa distanciamento dramático e é também o motivo pelo qual a relação da protagonista com seus amigos se torna superficial e imatura. No entanto e, apesar de tudo, percebe-se aqui uma noção de autoria na diretora italiana, autoria essa não muito presente em outras comédias dramáticas atuais, principalmente as americanas.

Alice Filippi soube atribuir referências fílmicas à sua obra e conciliar isso de maneira original, principalmente na primeira metade do filme, algo que se sobressai, inclusive, é a duração dos planos, Filippi constrói as cenas sem se pautar em inúmeros cortes por entre os planos, fato que decerto acrescenta muito ao resultado final. O que fica, ao final da obra, é a necessidade de se conhecer mais filmes presentes nas grandes plataformas de streaming que fujam o eixo norte americano, sobretudo produções dirigidas por mulheres.


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VISÃO GERAL
Avaliação
Ana Vitória
20 anos e rondoniense. Estuda Imagem e Som na UFSCar e é grande entusiasta de cinema vanguardista.
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