Nos créditos iniciais de Cabras da Peste, uma música instrumental emula as trilhas dos filmes policiais americanos dos anos 80. Nas imagens seguintes, casinhas coloridas contrapõem o tom e a música altera pra mesma melodia, mas tocada por uma sanfona e um triângulo. Esse começo anunciava que poderíamos estar prestes a ver uma dinâmica de homenagem a um gênero muito bem-vinda. Infelizmente, a ideia se transformou num amontoado de clichês que não funcionam.
No filme, o policial Bruceuilis (Edmilson Filho) viaja a São Paulo com o intuito de recuperar a Cabra Celestina, animal que fora sequestrado no Ceará. Ao chegar na cidade, encontra-se com Trindade (Matheus Nachtergaele), também policial e muito mais frustrado, e os dois descobrem um esquema de tráfico de drogas (ou “tóchico”, como diz Bruceuilis) comandado por cartéis internacionais.
A direção de arte e o figurino fazem um trabalho notável, dando vida às casas e roupas com cores vibrantes no núcleo cearense e controlando o tom dos ambientes paulistas com cores mais sóbrias. O mesmo não se pode dizer da decisão de colocar efeitos sonoros de filmes infantis em vários momentos, como o barulho de buzina quando um personagem move as orelhas, ou o som de pato de borracha quando outro personagem move a cabeça.
Em comédia, exageros bem utilizados fazem parte da quebra de expectativa. Na cena do interrogatório, o charuto aparecer do nada na boca de Bruceuilis já seria engraçado. Mas ele precisava apagar o charuto no braço e fazer uma careta? E aqui reside um dos problemas, porque parece que há necessidade de tudo ser exagerado e expositivo: legendas apresentando personagens, policiais que vão pra missa de farda, flashbacks – muitos flashbacks – e sim, ainda encontram espaço pra inserir a famigerada piada escatológica de pum.
Querem mais? Sabem onde é que dois homens se beijando parou de ser engraçado? Eu respondo, nos Anos 90. Mas aparentemente o roteiro achou por bem manter esse atraso de 20 anos no filme.
Muito do humor que não funciona também vem da falta de tempo entre os diálogos. Tudo é apressado, tudo é pra ontem. O mais curioso é que algumas gags dão certo justamente pelo tempo dado entre elas, como o cuspe de desprezo que vem no início e volta ao meio do filme, ou a pergunta “Que Guará?”.
As participações de Falcão como político corrupto, Leandro Ramos como bandido, Evelyn Castro como motorista do Uber (“eu gosto de Shrek 2”) e Rafael Portugal apenas com voz ao telefone são eficazes, mas é Victor Vallen que rouba a cena como o policial cearense que ajuda na investigação. O tributo ao gênero policial também acerta muito com a reinterpretação da música de Um Tira da Pesada, “The Heat Is On”, repaginada como “Calor do Cão” e cantada por Gaby Amarantos.
Olhando para os aspectos que funcionam, é notório que Cabras da Peste tinha capacidade pra ser uma homenagem bem feita. Por isso, não deixa de ser uma pena que todo esse potencial tenha sido desperdiçado.
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