Lembre por um momento da Gotham City pulsante dos filmes de Tim Burton. Resgate a mensagem dita em Batman Begins de “teatralidade e ilusão”. Faça um recorte da cena de ação com o Ben Affleck vivendo o herói. Essa mistura compõe o novo vigilante interpretado por Robert Pattinson.

Na trama, o morcego está vivendo os primeiros anos de sua vida como herói e precisa lidar com a máfia organizada da cidade ao mesmo tempo que investiga o surgimento de um serial killer: o Charada.

O filme é dirigido por Matt Reeves (de Cloverfield: Monstro, Deixe-me Entrar e Planeta dos Macacos: O Confronto e Guerra) que consegue dar uma visão única ao personagem: um rapaz pálido que se movimenta lentamente sem sorrir com sinais de trauma.

Tanto como Batman e tanto como Bruce Wayne.

E esse é o maior acerto do longa. Explorar a profundidade do herói de maneira intensa e nem sempre romântica. Ao mesmo tempo que apresenta descontrole e discute com o próprio Gordon, deixa uma lágrima escorrer de seus olhos ao ver que um menino se tornou órfão.

Reeves entende tão bem a mitologia do herói que revive o clima de tensão dos filmes do Nolan. Porém, incrementa elementos mais sólidos do noir (embora a trilogia anterior já usasse também). Se em Chinatown (1974) temos uma cidade suja, repulsiva que joga o detetive em uma trama repulsivamente feita por um incesto, aqui, Gotham é uma cidade tenebrosa cercada por escuridão, chuva e que também levará o herói a repensar a questão familiar.

Mas tente tirar Chinatown e colocar outras características do noir que o efeito será mantido. A narração do protagonista datando os dias e a sensação de perigo crescente são elementos vistos desse estilo tão popular entre os anos 40 e 50 em Hollywood. O diretor é tão consciente de tais peças que usa na composição do Charada, ao colocar uma voz asmática, algo similar no vilão de Escravas do Medo (1962).

O próprio Paul Dano entrega um vilão extremamente rico. Se em um primeiro momento se apresenta como um serial killer ameaçador, em outro é visto como um nerd pertubado que encontrou fama com outros loucos na internet.

Selina Kyle (vivida por Zoë Kravitz) une sensualidade e ameaça. A ladra consegue usar habilidades de sedução ao mesmo tempo que se estabelece na trama como uma lutadora competente. Mas o mais pertinente em sua personagem é como alterna o contraponto com o morcego. Inicialmente se mostra como voz da razão (“Você nasceu na riqueza”, diz para o herói), mas no último ato quase sucumbe ao descontrole. 

Tais aspectos unem a narrativa deixando-a extremamente intrigante. Mesmo que a trama coloque personagens com muita participação, mas que pouco acrescentam, como é o caso do vilão Pinguim (visivelmente trabalhado para as sequências).

Mas o maior problema está na forma como Reeves busca impactar o público.

O diretor abusa da trilha sonora em todos os momentos que o herói surge na tentativa de criar uma atmosfera épica e grandiosa. Algo que no segundo ato não é efetivo, visto que a única forma que Reeves encontra de deixar a cena dinâmica (um problema recorrente em sua filmografia).

Porém, a obra consegue unir de personagens interessantes a um padrão estilístico fora da curva na maioria das produções atuais dos filmes de super herói. Estabelecendo um protagonista não muito carismático (mas interessante), uma cidade que não vê a luz e uma corrupção forte em seus setores públicos. 

Por um momento eu esperei um policial falar: “Esqueça, Gordon. Isso aqui é Gotham City”

 

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