Uma boa história normalmente é concebida por alguém que entende do que está falando. Seja o assunto fruto de pesquisa que demorou anos de trabalho para ser concluída, seja ele fruto das memórias do autor, ninguém compõe algo do nada, num estalar de dedos.

O caso do filme argentino As Boas Intenções é o segundo exemplo. Na trama, Amanda e os irmãos são filhos de pais separados. Gustavo, o pai, é cool, músico, estiloso, passeia com os filhos ouvindo e cantando música alta. Cecília, a mãe, é preocupada, responsável, cujo novo companheiro é um sujeito que veste echarpe, bigodinho arrumado e óculos de grau. Notório contraste com o cara que leva os filhos pra um jogo do River Plate na chuva e faz com que um deles fique doente.

Mas é claro que as crianças não ligam pra isso. Amam o pai, assim como o pai as ama. As imagens de arquivo simuladas transmitem uma sensação de nostalgia, diversão e felicidade que nos faz temer pelo que vem a seguir, o conflito pela mudança de cidade.

Um bonito destaque fica para a trilha sonora, composta por músicas da banda que o pai e os amigos tiveram na época. Baladas românticas, canções infantis, ou rocks mais pesados, todas combinam bem com o clima que a diretora Ana García Blaya quer repassar.

Blaya, aliás, possui um inegável controle sobre as reações da protagonista Amanda. Quando o pai vai contar à pequena sobre a mudança, o quadro foca na feição incrédula dela, por mais que quem esteja falando seja outra pessoa. Em outro momento, Amanda aparece deslocada: enquanto mãe e irmãos comem na mesa de jantar, ela toca fragmentos da música do pai no piano.

A pista que o filme iria transitar por questões de amadurecimento estava no início. Uma casa bagunçada, filmada com uma câmera na mão, objetos, pedaços de rostos, Amanda se acordando, calçando um All Star em um pé e um chinelo no outro: ali estava não uma pessoa completa, mas alguém em formação.

E é por entender bem o que Amanda sentia que As Boas Intenções consegue um bom resultado. Uma história concebida por alguém que sabe do que está falando.


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VISÃO GERAL
Avaliação
Concluiu cursos ministrados por Pablo Villaça e o Curso Básico de Cinema da Casa Amarela (Universidade Federal do Ceará). Assiste muitos filmes, lê muito sobre cinema. Embora saiba que pra vencer importa mais campanha do que qualidade, sempre se empolga com temporadas de premiação.
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