Esqueça Coringa, Pennywise ou Bozo. O personagem do título tem muito mais a ver com aquele que Selton Mello faz em O Palhaço do que qualquer outro palhaço mainstream. Bem, mas quem já assistiu a alguns filmes do diretor Pedro Diógenes e sabe da tara que ele tem por pessoas tristes cantando em público meio que esperava que A Filha do Palhaço fosse fazer parte de uma categoria muito específica de filmes, a categoria “Filmes de Palhaços Deprimidos”.
Joana (Lis Sutter) é uma garota de 14 anos que possui um ímpeto de desbravamento, teimosia e impulsividade que só os adolescentes podem ter. Ela se vê com a oportunidade de passar uns dias na casa de Renato (Demick Lopes), seu pai ausente que possui como profissão se apresentar em bares e churrascarias como Silvanelly, uma chamativa personagem humorística.
Renato é desacostumado como pai, mas se revela, ao mesmo tempo, liberal e protetor. Sai com a Joana à noite e permite que ela tome uma cachacinha, ao mesmo tempo que se preocupa quando ela some, espera na rua depois de deixá-la na casa de um colega, ou recusa gentilmente quando a garota lhe pede um cigarro.
Assim como fazem muitos bons artistas, o roteiro insere as experiências da vida cotidiana de Renato e Joana nas apresentações de palco do humorista, brincando e traçando paralelos: se a garota acaba de chegar em um local desconhecido, Silvanelly pergunta pra plateia de que estado cada um veio.
Se Joana tem decepção amorosa, a personagem faz piada sobre homens que não prestam. Se Joana nega a companhia do pai para dar preferência ao celular, Silvanelly critica o vício nas redes sociais.
Além desse desenvolvimento, o roteiro escrito a 6 mãos sabe fazer graça com a simplicidade: “Esse é bom, tem uma fixação ótima”, comenta Renato quando a filha prova um batom em uma loja de maquiagens.
Falta qualidade, no entanto, na hora de transpor muitos dos diálogos para a boca dos personagens. As falas dos protagonistas soam explicadas demais (“Espera.ponto-final.-eu-quero-ir-com-você.ponto-final”, diz Renato depois de deixar Joana na escola). Essa rigidez não se justifica nem pela falta de intimidade das relações visto que, mesmo quando há uma aproximação, a artificialidade permanece.
Além disso, mesmo que o próprio diretor já tenha provado que falta de orçamento não é desculpa para falta de apuro (vide os ótimos Pajeú e Inferninho), há um momento em A Filha do Palhaço no qual é possível ver o microfone invadir quadro. Ok, é um detalhe mínimo, mas que, unido a tudo, prejudica a experiência e evidencia um certo desleixo.
O desconforto é necessário para superar etapas e traumas. Como dizem os palhaços no Teatro do Sótão do filme, “se cai uma lágrima, tudo bem, é a vida”. Joana, ao final, guarda as pelúcias em uma caixa pra doação, representando o amadurecimento após a jornada de desconfortos e experimentações. Após essa experiência um tanto quanto frustrante, resta torcer para que a próxima obra do diretor retome a qualidade já comprovada antes.
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